O observador da solidão

A noite chuvosa trás recordações tristes quando eu sento no banco do ônibus pra casa.
Estamos cercados por pessoas que não dão à mínima, pessoas sentam ao seu lado por mais de meia hora e não te enxergam.
Somos invisíveis uns para os outros.
...
É a banalidade da companhia inevitável.
Pelo vidro embaçado que me separa do mundo lá fora vejo o reflexo da solidão das pessoas que embarcam comigo no ônibus pra casa. Todos sentados com suas cabeças balançando vazia.
Na minha mente toca Simon & Garfunkel.
O ônibus pra casa parte e o som do seu motor é como o urro das bocas da Tia Mate babilônica.
Foi então que, por alguns minutos, minha solidão foi interrompida por um velho barbudo de roupas rotas encharcado pela chuva fria e constante que caia lentamente enquanto ele ajunta papelões na calçada. Era um observador da solidão assim como eu. E nós observamos a solidão um do outro e, naquele breve instante, deixamos de estar só. – Até partir o ônibus pra casa.
Nas calçadas as pessoas caminham cegas sob as luzes de neon que nos impede de contemplar as estrelas. Seus olhos fixos numa única direção os privam das pessoas, a mente entorpecida pela fadiga de trabalhos absurdos os priva da vida.
Somos formigas trabalhando com medo do inverno.
Um jovem casal se levanta equilibrando-se ao chacoalhar do ônibus, apóiam-se um no outro. Ele da o sinal. Ela o abraça. Ele fala algo em seu ouvido. Ela o aperta. Eles sorriem!
Saltam do ônibus com pressa, um jornal é aberto sobre suas cabeças e correndo juntos na chuva, parecem gêmeos siameses. Logo eles somem deixando pra trás o eco de suas risadas. Eu dou um sorriso e torço pra que seja verdade enquanto o ônibus pra casa parte aos solavancos.
Agora, a nossa frente, uma longa avenida serpenteia eliminando as pessoas das calçadas e encarcerando-os em seus automóveis. Vejo pernas e ombros sem rostos, vidros fechados e limpadores de pára-brisas convulsivos, as pessoas estão mais isoladas do que nunca.
O ônibus pra casa rasga a avenida com voracidade, rugindo e baforando seus gases tóxicos e quanto mais se afasta do Centro, mais vazias, estreitas e escuras vão ficando as ruas.
Diferente de nós, vejo um velho bêbado dormindo sob o toldo de um bar fechado e ao seu lado seu fiel cão faz companhia.
A cada ponto o ônibus expele os passageiros de seu interior e esses descem para um destino certo, em direções já conhecidas. Uns correm ansiosos, felizes. Outros nem tanto, caminham cabisbaixo com seus olhos perdidos ou tensos e até mesmo tristes.
Mas há aquele que desce e fica ali parado, olha de um lado a outro sem saber aonde ir, ele cruza os braços e fica ali... Parado... Enquanto o ônibus pra casa continua seu destino.

http://wagnerrsouza.blogspot.com/
 Autor Convidado: Wagner R. Souza

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